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mar 11 2014

Movimentos Autonomistas e as Manifestações de Junho

Published by under roda de conversa

Com o tema “Movimentos Autonomistas e as Manifestações de Junho”, ocorreu, no dia 13 de fevereiro, mais uma Roda de Conversa promovida pelo Núcleo de Filosofia Política – FiloPol da Unifesp. O debate contou com a presença do professor da USP-Each e militante de movimentos autonomistas e antiglobalização Pablo Ortellado, que também é coautor do livro “Vinte Centavos: a Luta contra o Aumento”1. Por mais de duas horas, Ortellado e os cerca de 90 participantes da Roda de Conversa debateram, analisaram e trocaram experiências sobre as “Jornadas de Junho”.

Ortellado apresentou três eixos de análise sobre as manifestações de junho de 2013. Destacou, primeiramente, que os grandes protestos de 2013 foram consequência de um processo e de um histórico de resistências aos reajustes nos preços do transporte público que remontam cerca de 10 anos, e que mobilizaram centenas de milhares de pessoas em diversas cidades e capitais do país, como Salvador e Florianópolis. Sobre os que falaram que foram pegos de surpresa com os levantes de junho de 2013, Ortellado disse que não acompanharam as movimentações sociais dos últimos 10 anos que trataram da mobilidade urbana e do acesso à cidade. Ele afirmou que “[os partidos, a grande imprensa, a academia] não olhavam [os protestos] porque não ocorriam nas grandes cidades [do sudeste]”.

O segundo aspecto, ou segundo eixo, foi a cobertura feita pelas grandes empresas de imprensa do Brasil. Ortellado identifica uma mudança no discurso dessas empresas a partir do protesto ocorrido em São Paulo no dia 13 de junho. Até essa data, havia unanimidade no discurso, tratando os manifestantes como vândalos e condenando os atos. Ao mesmo tempo, pesquisa realizada pelo jornal Folha de S. Paulo anterior ao dia 13, apontava apoio maciço da população aos protestos e a reivindicação de não aumento das tarifas de transporte. Isso foi confirmado pelo grande número de manifestantes que se reuniram para o ato do dia 13 de junho. Para Pablo Ortellado, é a partir desse momento que a grande imprensa passa a apoiar as manifestações, ao mesmo tempo que distingue o que ela denominou de “vândalos”. Concomitantemente, ela opera com o que Ortellado chamou de “pauta difusa”, onde passa a introduzir diversas outras pautas às manifestações, inclusive como mais abrangentes e mais representativas do que a resistência contra o aumento das tarifas. Segundo Ortellado, “os meios de comunicação se apropriaram das manifestações através da pauta difusa”, tentando abafar a questão da redução das tarifas e sugerindo que os atos do mês de junho eram “contra tudo”, principalmente contra a corrupção.

Essa transformação do discurso, primeiramente de total rechaça às manifestações, depois de apoio às mesmas, distinção do chamados “vândalos” e introdução da “pauta difusa”, foi protagonizada principalmente pela revista “Veja” e pela Rede Globo. Ortellado fez referência, inclusive, à mudança do editorial e da manchete da revista “Veja” de 14 de junho, influenciada pelas grandes proporções e apoio popular aos protestos que culminaram no ato de 13 de junho.

A terceira questão levantada pelo autor de “Vinte Centavos…” foi sua avaliação sobre os métodos e estratégias políticas, as consequências e as conquistas das jornadas de junho. Para ele, tais protestos são como que “parentes” das grandes mobilizações de Madrid e do “Occupy Wall Street”, por exemplo. São “parentes” por apresentarem algumas características organizacionais comuns, como a horizontalidade, o uso dos meios de comunicação (especialmente as redes sociais pela internet) e o apartidarismo. Porém, as manifestações no Brasil apresentaram uma diferença substancial: não se perdendo em uma ampla pauta política, estabeleceram um objetivo único e claro: a redução das tarifas dos transportes públicos. Tal reivindicação sempre foi colocada como inegociável, e foi a grande mobilizadora dos protestos. Diferentemente das mobilizações na Europa e em Nova York, o objetivo dos atos no Brasil foi alcançado. Os protestos, assim, não recuaram, mantiveram sua pauta, e não traíram o movimento e os manifestantes, concluiu Ortellado.

Após essa apresentação, o debate que se seguiu ressaltou pelo menos quatro grandes aspectos: o papel das Redes Sociais nas mobilizações, a interferência dos grandes meios de comunicação, a relação entre as jornadas de junho e a copa das confederações de 2013, e as ações e táticas “Black Bloc’s”.

Ortellado ressalta sua defesa ao grupo Black Bloc, sendo ele um dos únicos acadêmicos neste momento que tem tido tal posicionamento público. Por considerar que quebrar bancos e janelas não se trata de violência, que se refere a um dano corporal e o alvo dos Black Blocs sempre são coisas, objetos e não seres humanos. Em seu artigo – diz “O que mais lamento neste momento é ver grupos de esquerda não divergindo dos Black Bloc, mas denunciando-os e criminalizando-os em termos muito parecidos aos das forças de repressão do Estado.”2

Por fim, Pablo Ortellado destacou mais uma grande consequência das manifestações de junho de 2013: elas contribuíram decisivamente para que o tema dos transportes e da mobilidade urbana ocupasse o topo das preocupações brasileiras. Portanto, introduziram um relevante tema na agenda política do país e, obviamente, na pauta das três esferas de poder.

1Ortellado, P., Judensnaider, E., Lima, L. e Pomar, M., Vinte Centavos: a Luta contra o Aumento, Editora Veneta, 2013.

2 Ortellado, Pablo. (2014), “Os Black Bloc e a violência”. Le monde – diplomatique Brasil, março, pp. 31.

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